segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ansiedade de separação

        

        Vamos começar dar dicas e ensinar alguns exercícios para problemas que mais ocorrem no relacionamento cão-humano. Como sempre, primeiro falarei como evitar, para depois entrar no como corrigir.
         Vocês virão também que as coisas não são tão simples assim, que as questões devem ser avaliadas para então serem corrigidas ou melhoradas. Por isso, algumas vezes é imprescindível o acompanhamento do caso por um profissional de comportamento.
         Então você adquiriu seu cão, filhote, com 45 a 60 dias (melhor com 60 dias por questões relacionadas ao desenvolvimento físico e social, 60 dias é a idade correta de desmame de filhotes a não ser que eles larguem por si só antes). Então como tirá-lo de seu meio onde ele está com a mãe (cheirinho confortante) e irmãos?
         A esmagadora maioria das pessoas faz o seguinte: vai até o canil, compra e leva pra casa. Muitas vezes no domingo à tarde. 
         Então vamos imaginar que somos filhotes de cachorros? Faremos agora um tour do canil à casa de nossos guardiões da maneira clássica mencionada:

        "UÁÁÁÁÁ!!!! Ai que soninho gostoso! Quentinho ficar aqui entre as pernas da mamãe! Ui! Fome! Vou mamar um pouquinho... Cheirinho bom da minha mãe! Leite quentinho!"
         Mais tarde.... "Bom, vou brincar com meus irmãos!" Mordidas daqui, de lá, rola pra lá e pra cá! "Estou cansado, vou tirar uma soneca." 
         Lá vem aquele humano limpar nossa casa... O cheiro dele é forte, sei que está chegando, sei até o horário já, todo dia é igual! E essa musiquinha de fundo? Gosto dela!"
         E assim se desenrolam os nossos dias.
         Até que um dia:
         Ai que filhote bonitinho!!! Quero aquele. 
         "Quem é essa pessoa??? Está me pegando no colo!!! ARGH! Atchim!!! Que cheiro forte! O que é??? Fruta? Flor??? Ai! Que coisa engraçada é essa brilhando?"
        Ai amor!!! Que lindo!!! Ele está dando beijinhos na minha orelha! Quero esse!
        "Uau! Que quarto estranho! Nossa! Como estou andando sem mexer as patas??? Que barulho!!! Quanta gente!!! Nossa! Au! Au! Porque parou? Atchim! Gostei desse negocinho brilhante!!! Quero morder!!!
        Que lugar grande! O chão é frio, cheiro de flores, de filhote. Deixa ver tudo isso."
         Nossa amor! Olha como ele é espertinho! Já foi explorar nossa casa... Vamos dormir que amanhã é dia de trabalho. Olha fofinho! Você já tem uma cama caríssima que comprei, recheada com plumas de ganso e todos esses brinquedos importados! Também li que tenho que deixar uma peça de roupa minha com você para que não se sinta sozinho e deixar uma música tocando. Aqui está sua água e sua ração de filhotes caríssima. Ali é seu banheiro, vê? Tem um tapete que absorve tudo, porque vi o moço falando na TV que você não gosta de molhar as patas.
        De tudo isso que a sua nova guardiã disse, você entendeu: Pó Pó Pó, Blá Blá Blá, Pó Pó Pó!
        "Nossa! O que ela tanto fala?" Você corre a cheirar tudo! Explora cada milímetro daquele lugar e quando se vira novamente: "Cadê aquela humana? Ué! Cadê meus irmãos? Estou com sono, mas cadê minha mãe? CAdê o cheiro e o quentinho do corpo dela? Cadê a musiquinha? Que som é esse? Está me incomodando! Doendo meus ouvidos! Au! Au! Sniff!"
        E você começa a chorar baixinho para que lhe devolvam seu lugar, seus irmãos, sua mãe, sua musiquinha, seus cheiros.
        De repente, um objeto bate no portãozinho da sua casinha, fazendo um ruído metálico muito alto, você leva um baita susto! "Ai! Que horror! O que é isso? Um monstro tentando me pegar???" E chora mais alto ainda, aos berros chamando alguém pra lhe salvar, chamando sua mãe, seus irmãos, o humano que limpava sua casa! "Cadê todo mundo?"
        Então a humana chega falando de uma forma nada amigável, com a face contraída e a voz forte e alta. "Eu não entendo o que ela diz... Que bom que veio até aqui... ufa! Então quando eu estiver em apuros é só gritar bastante que alguém vem ver o que há... entendi!" Então a sua nova guardiã, depois de ter lhe explicado o porque você tinha que ficar quieto, volta pra cama e você volta a chamar alguém! "Ai que solidão! Quero minha mãe!!!! Essa humana está sempre gritando e com feições não amigáveis!"
        E assim segue sua vida. A cada dia que passa, você acha mais e mais confusa a maneira com que aquela gente lhe trata e não desiste de chamar sua mãe ou alguém, pois quando você fica sozinho, coisas estranhas acontecem, você sente uma angústia e uma solidão! Também sente medo de ser devorado por algum monstro. Você não sabe bem o que fazer, mas sabe de uma coisa: detesta ficar sozinho!

        Isso é apenas um resumo do tipo de trauma ao qual submetemos um filhote quando simplesmente o retiramos do ambiente ao qual ele é habituado e colocamos em outro totalmente estranho. Você já tinha analisado por esse ângulo? Pois bem, percebeu que essa não é a melhor forma, não é? Principalmente se pensarmos que nessa idade, dos 45 aos 60 dias, o filhote ainda está na fase de sociabilização, ou seja, na fase em que ele aprenderá TUDO o que levará para a vida. Não à toa, esta fase se sobrepõe à de traumas permanentes, ou seja, TUDO o que acontecer nesse meio tempo e até os 90 dias (quando acaba a fase de sociabilização e de traumas permanentes), o cão arrastará por toda a vida. Então, traumatizá-lo com a solidão, só complicará sua vida, pois tudo o que poderá ser feito daí em diante é amenizar o fato e jamais "curar o cão" de seu medo de ficar só. Você sofrerá, assim como seus vizinhos e PRINCIPALMENTE o cão.

        Então o que fazer para evitar esse trauma? 
        O foco é dado exatamente à forma com que você retira o filhote do criador. E isso tudo também serve para as pessoas que retiram os cães para vendê-los em pet shops.

        1) O ideal é pegar o cão com 60 dias. Desde os 45 até os 60 dias visite o cão, brinque com ele, passeie com ele. Faça a ADAPTAÇÃO. Perceba alguns ítens da paisagem, se o dono do canil costuma colocar músicas para o cão, procure se inteirar de quais tipos de músicas costumam ser colocadas. Caso possa sair com o cãozinho, faça isso e volte com ele para o canil de carro mesmo para que ele confie em você.
Sei que nem sempre isso é possível, mas tente adaptar esse ideal à realidade.

        2) Quando chegar o dia de levá-lo realmente para casa, ainda assim pegue uma flanela ou qualquer outro pano, esfregue-a nos irmãos e na mãe e leve consigo para casa junto com o filhote. Você também pode, numa dessas visitas, deixar um paninho que deverá ser colocado no ninho deles por alguns dias e levá-lo pra casa no dia D.

        3) Busque o cão SEMPRE NO SÁBADO PELA MANHÃ. Caso seja um feriado, vá na manhã do primeiro dia de feriado. Dessa forma você terá tempo para adaptar o filhote em casa e na sua nova cama.

        4) Nos primeiros dias o cão deverá dormir no quarto ou mesmo na cama. O QUEEEE???? É isso mesmo e eu não estou ficando louca hehehe. Mas por que então? Eu explico:
                a) o cão já estava acostumado a dormir em grupo e dormir na sua cama será o mais próximo da rotina dele.
                b) ele VAI CHORAR, portanto a chance de você ceder por pena e ele ir parar na sua cama é imensa, por isso a gente sugere que se pule esse sofrimento inicial justamente para não acostumar o cão a chorar e latir para pedir as coisas.
                c) é mais fácil tirar o cão da sua cama sem traumas que fazê-lo esquecer traumas ou que gritar traz a mamãe pra perto.

        5) Enquanto ele dorme com você na cama à noite, você passará o dia todo ou boa parte dele (já que é final de semana ou feriado) com o filhote no local em que ele deverá ficar quando essa fase passar. Se a casinha dele será na lavanderia então fique lá com ele e não na sala de estar. Brinque com os brinquedos dele, brinque com ele neste local, pois o cão também tem memória e imaginação, portanto, ao ficar sozinho à noite neste local ele sentirá seu cheiro e lembrará das brincadeiras o que o confortará.

        OBS: o seu cheiro nessa altura, também será importante para o cão, pois ele já terá associado a coisas prazerosas.

        6) O paninho que você pegou, deverá ser colocado junto às coisas do cãozinho quando você não estiver com ele (mas estiver em casa), ou pode ser colocado na caminha no seu quarto caso você decida não colocá-lo na sua cama pra dormir nos primeiros dias. Esteja ciente que você não deverá colocar o cão na sua cama caso ele chore... Assuma essa responsabilidade!

        Em uns 3 dias, todo esse esforço terá surtido efeito. Desde o início do treinamento você poderá distanciar o cão de você fazendo-o permanecer cada vez mais tempo no local que será dele, preparando-o para dormir lá. No início não feche o cão no local.

        Quando ele efetivamente for colocado na lavanderia para dormir, ainda há grande chance dele chorar, mas você estará mais seguro de que ele não está sofrendo tanto e também o choro não será tão persistente. De qualquer forma, prepare-se para NÃO CEDER.

         Neste post eu falei especificamente sobre como EVITAR O TRAUMA DA SOLIDÃO.
Obviamente existem outros assuntos que também preocupam muito uma pessoa que irá adquirir um novo cãozinho, como xixi e cocô e destruição. Também é de pequeno que se colocam regras, pois dessa forma é muito mais provável que não se precise lançar mão de punições como borrifadores e estalinhos. Mas no próximo post eu falo sobre esses outros assuntos.

Abraços
Bicho!



2 comentários:

  1. A-do-rei este post! A forma como você colocou o ponto de vista do cão ficou excelente! Bjs

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  2. Obrigada Cássia!!!
    Ainda faço um filminho com isso! Se as pessoas perceberem a aflição do cãozinho ou de qualquer outro animal... se elas perceberem que agindo como agem estão submetendo os filhotes ao seu primeiro trauma... talvez alguma coisa possa mudar!
    I hope so!

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